quinta-feira, 12 de julho de 2012

Três Minutos de Emoção e o Anticlímax do Jogo Final


A torcida do Porco nem esperou o apito final para vibrar.

                                                      
Logo no início da transmissão de Parmêra e Coxa, pela Copa do Brasil, o colega Maurício Noriega, comentando pela ESPN, aludiu à atmosfera que envolvia uma final de campeonato. Não lembro exatamente quais foram suas palavras, mas era clara a emoção que ele sentia ao frisar a contagiante vibração coletiva da qual era partícipe. Era o tal clima de final.

Algo que não houve, por exemplo, na sombria arena onde se realizou a primeira partida da final... Puft! Primeira partida; que papo é esse? Final é final, e ponto final. Sou contra a realização de uma final bipartida.

Senão, vejamos. A partida de ontem - todos os que viram, sabiam, e os que não viram, sabiam também - foi totalmente baseada no placar do primeiro jogo, resultando num time de marcação resistindo a outro que tentaria lhe fazer pressão; a very boring script...

Na tentativa de se fazer “justiça”, para que as duas torcidas possam comparecer e o fator campo seja favorável a ambas as equipes – na verdade, só para dobrar a renda -, criou-se a dupla-final, na qual, muitas vezes, o clima é, mas pode não ser, de uma grande final; principalmente quando há diferença de mais de um gol no “jogo de ida” – algo já feio desde sua denominação!

De uma final eu espero o clima ao qual se referiu o Noriega; um clima diferente, com uma “densidade diferente”, no qual toda a cidade – e não somente os que comparecem ao estádio – pulsa no mesmo ritmo. E não é que isso não ocorra no jogo de ida; apenas é diferente, pois o jogo de volta é que se configura numa grande final. Só este jogo literalmente final tem condições de propiciar o sentimento de que se está à beira do Paraíso ou do Inferno, pois não haverá amanhã: a decisão é hoje! É o jogo final! O dia do Juízo!!!

Tal sentimento deveria ter cadeira cativa, obrigatoriamente, em toda final, pois é nele que está aplicada toda a devoção do torcedor; é para isso que ele torce e paga ingresso, enfrentando todo o caos que o acompanha até seu lugar na arquibancada. Mas, não, amigos; não está!

Ontem, vos digo, este sentimento tão nobre, tão vital, tão... Visceral!, ontem, este sentimento mal teve lugar; no mínimo, o teve em escala muito menor do que se esperava. A primeira vez, antes do apito inicial, quando as expectativas eram todas, de parte a parte; e a segunda, durante os míseros três minutos que separaram o gol do Coritiba do gol do Palmeiras. Somente ali, naqueles parcos porém mágicos três minutos, o futebol viveu o ápice das emoções que somente uma final propicia, mas que logo encontrou seu fim na cabeçada surpresa de Bentinho. Antes dela, porém, uma torcida, enlouquecida, era pura expectativa, e a outra, assustada, a mais pura angustia: conseguiria o Coxa fazer o segundo? E o Palmeiras, vai segurar a onda?

Fez mais: empatou. E o jogo logo esfriou.

Dali em diante, num cenário avesso a maiores emoções, posto que os paranaenses dependessem de mais três tentos, perdurou certo anticlímax no Couto Pereira, até o apito final, quando, com sensação de dever cumprido, a gurizada do Felipão pode gritar “somos campões”!

Fica a pergunta: Pode isso, Arnaldo? Pode uma final ser, digamos, parcialmente degustada? É justo que um jogo que representa o porquê de todas as coisas possa ter sua própria identidade diluída por fatores precedentes? Ao imaginar que, não somente aqueles três minutos, mas que toda a partida pudesse transcorrer em perene estado de ebulição, chego à conclusão que o sistema poderia ser melhorado.

Por que não se inspirar, por exemplo, nas grandes decisões europeias, nacionais e continentais, as quais não fogem ao espírito do embate final, em campo neutro? Não é assim nas Copas da Itália, Espanha, França, Inglaterra, etc.? Não é assim na Copa dos Campeões da Europa? Por que, então, não se pensa em fazer o mesmo por aqui, com a escolha do palco do jogo final com antecedência, com divisão de ingressos e estrutura de apoio ao torcedor?

Não quero menosprezar o título dos Porco, mas acho que as duas partidas finais dessa Copa do Brasil só empolgaram aos próprios torcedores envolvidos, pois, por alguma razão (ou várias), não se criou, em ambas as partidas, a atmosfera de luta e vibração que se espera de jogos assim.


Foto de João Sassi
Varjão - DF


segunda-feira, 9 de julho de 2012

Porque o Mundo Precisa de Cores!

Capacete e o Papagaio-de-Vintém: tradição que faltou ao tricolor.

Ao entrar em campo vestindo seu uniforme branco (o chamado #2), o Fluminense demonstrou total falta de sintonia com a data centenária do clássico, chegando a ser desrespeitoso com a própria história do FLAXFLU.

No campo do Borogodó este tema já foi visto, e conforme adverti em “Virou Todo Mundo Japonês!”, a questão simbólica envolvendo o uniforme dos clubes e das seleções nacionais merece mais atenção da parte de todos.

Senhores, o que deu na diretoria tricolor – mandante da partida de Domingo – para ordenar que o time fosse a campo em brancas cores? Inclusive nas preliminares, quando a velha-guarda rubro-negra trajou o tal Papagaio de Vintém, indumentária com a qual se apresentara no primeiro FLAXFLU, em 1912, numa demonstração bonita do espírito esportivo e do resgate às tradições que a festa demandava.

Qualquer criança – e nas crianças podemos sempre confiar! -, se instada a dar seu pitaco sobre o clássico, haverá de mencionar o colorido do evento: a mistura de cores que ocupa as arquibancadas e desce até o campo pelo flamular das bandeiras em meio ao fumacê rubro-negro ou ao pó-de-arroz tricolor, emprestando características expressionistas ao espetáculo futebolístico. Era isso que, ouso eu escrever, quiseram dizer Nelson Rodrigues e Mário Filho: que as multidões, quando despertadas, vislumbraram, 45 minutos antes do nada, o colorido que daria mais brilho à existência humana, corando o imaginário de todos nós em preto e vermelho; em grená, verde e branco!

Falar de FLAXFLU é, por tudo isso, um enaltecimento à própria cultura brasileira e à sua diversidade étnica. É também, o emblema perene das classes sociais representadas em cada uma das agremiações, manifestado na transversalidade das cores que simbolizam o espectro socioeconômico nacional. O Flamengo, em envolventes faixas horizontais pretas e vermelhas como as da pomba-gira, presente nos terreiros afro-brasileiros escondidos por nossa hipócrita nação. E o Fluminense, com elegantes e longilíneas líneas de cores tão aristocráticas como sua torcida, a começar pelo grená – do Francês, grenat...

Pois toda esta pompa e circunstância foi menosprezada pelo time de Laranjeiras; um passo mal dado que seria o prenúncio de um jogo cinza como foi a tarde de ontem. Não fosse o filho único parido por Fred, logo no início da peleja, e o grande clássico teria sido tão sem graça como o alvo da camisa tricolor. Ainda bem que o Flamengo não entrou de amarelo e azul – de Tabajara, já basta o Joel...


Foto: Maurício Val/Vipcomm


quinta-feira, 5 de julho de 2012

Salve o Corinthians - o Libertador da América!

A República Popular do Corinthians em 1º lugar.

Eu ia escrever sobre o sentimento que leva um corintiano a orgulhar-se de ser corintiano. Mas logo desisti, pois não sendo corintiano, é certo que o resultado resvalaria numa brejeirice atroz, descambando com frequência para a pieguice dos testemunhos épicos.

Quis escrever algo porque, mesmo não sendo corintiano, ontem me flagrei em frente à TV, torcendo como louco.

Logo eu que durante toda a Liberta amaldiçoei a caretice do Tite e o irritante (porém eficiente) futebol de resultados da equipe. Ademais, não queria fazer parte do mesmo côro que um Andrés Sanchez, ou muito menos compactuar com a beligerância de algumas facções de manos fanáticas pelo alvinegro de Parque São Jorge.

Por essas razões, torci sempre contra o Curínthia: torci contra quando se classificou; torci contra quando passou do Emelec; torci contra quando Cássio operou um milagre diante do  Vasco; e torci mais contra ainda quando se impôs, indiscutivelmente, ao Santos de Neymar – time de minha predileção após a desconcertante eliminação do meu Mengão.

Mas foi o Timão que chegou à decisão.

E logo contra o Boca Jrs.; uma espécie de Golias das Américas. Um colosso em forma de Bombonera que há décadas impinge o terror pelo continente, esmagando sem dó qualquer esquadra que lhe faça frente. De Norte a Sul, de Palmeiras a Santos, do Grêmio ao Flu, do Flamengo ao Papão da Curuzu, todo mundo já foi triturado por aquela maldita boquinha doirada e azul.

Talvez por esta razão – pelo inimigo em comum, por sermos vítimas em comum! - tão logo o juiz apitou o início do embate, lá estava eu, totalmente conectado à Fiel, atento a cada movimento no Pacaembu. Parecia a Esquerda brasileira, em 70, que, na hora do vamos ver, mandava o Médici à merda e abraçava a causa verde-amarela em solo mexicano.

Torci mesmo, e me emocionei e vibrei muito com os dois gols históricos do Sheik, e mais ainda com sua astúcia: “Malandro que é malandro dá nó em pingo d’água, boludo!”, deve ter dito o safo atacante ao xeneize que fungava em seu cangote.


Foi gostoso torcer pelo Corinthians, ainda que uma única vez na vida. Foi bom estar irmanado àquele bando de loucos que, mesmo com todos os defeitos, mostravam-se meus aliados na luta contra a ditadura bostêra.

Creio que neste 5 de julho, ao invés de demonstrar recato e dor de cotovelo, deveríamos todos os torcedores brasileiros agradecer ao Sport Club Corinthians Paulista por nos haver libertado do complexo de inferioridade do qual padecíamos frente ao imponente e prepotente inimigo do Sul.

Chupa, Boca! Vai, Corinthians!

 Foto: João Sassi

“O Salto de Vampeta” - Palácio do Planalto/DF


terça-feira, 3 de julho de 2012

O Papel do Torcedor Pastel


Quando a FIFA dá bola-fora, a torcida é sempre atingida.
Quando perguntaram ao Frei Leonardo Boff o porquê de ser pessimista quanto à realidade atual, ele respondeu que não era o caso, mas sim de ser realista ante a péssima realidade.

Podem, portanto, me chamar de ranzinza ou de coisa pior, mas é de aspectos negativos que este texto vai tratar. Pensei que era necessário fazer uma breve reflexão sobre situações que me tem chamado a atenção e que podem se tornar tendências de gosto duvidoso.

De maneira geral, este blog tenta abordar o mundo da bola fazendo, quando possível, um contraponto entre o futebol de ontem e o futebol de hoje, não por simples romantismo ou nostalgia, mas por acreditar que algo muito importante – algo diretamente associado à essência desse esporte – esteja se perdendo, se deturpando ou, no mínimo, se desvirtuando.

Um exemplo.

Voltemos algumas semanas; à final da Liga dos Campeões da Europa. O juiz acaba de apitar, determinando o fim do jogo, e o Chelsea é campeão. Enquanto os jogadores do time inglês festejam em campo a épica e improvável vitória contra os germânicos, seus alucinados torcedores, simplesmente extasiados, celebram a conquista nas arquibancadas.

Eis que não mais que de repente, em meio à catarse de todos – vitoriosos e derrotados -, menos de um minuto após o fim do jogo, surge uma música estrondosa pelo moderno sistema de som do estádio, sufocando os gritos de alegria, tratando a euforia do sucesso ou a dor do fracasso da mesma e fria maneira: como pequenos e dispensáveis detalhes no cronograma da festa.

Os gritos de guerra e as canções de júbilo que se danem, se o hit da moda é o que deve ser ouvido pelo torcedor que está no estádio ou mesmo por quem está em casa, sob risco de toda celebração parecer uma cópia reeditada de si mesma, dada a pasteurização caracterizada pelo enfadonho FIFA modus operandi de ser. Nele, mais importante que a vida em si e as emoções sobre as quais o jogo se sustenta, é saber se o palco sobre o gramado já está pronto para receber os doutos sanguessugas do esporte, ávidos por aparecerem na foto à hora da premiação (ou mesmo para surrupiar una medallita, de quando em vez).

Claro, não se pode esquecer a maquininha cuspidora de papel prateado, algo que surgiu como novidade aceitável, mas que ninguém supunha que se tornaria um lugar comum, por vezes inconveniente ou mesmo deselegante; cafona, mesmo. 

No futuro já experimentado, todas as imagens se condensarão num tablado asséptico estampado por patrocinadores e ornamentados por papeis prateados; será impossível diferenciar as conquistas, o local, a cidade ou até o estádio em questão. Tudo terá de ser dentro do novo padrão mundial, segundo o qual a espontaneidade não será mais encarada como uma qualidade, senão como um acontecimento pouco benfazejo.

Nesta recém-encerrada Eurocopa, após cada gol, uma mesma música ecoava pelos autofalantes e estimulava os torcedores a comemorá-los do mesmo modo, entoando-a em uníssono, independentemente de qual seleção o marcasse. Se fosse gol, todo mundo cantava ô-ô-ô e pronto! Quando saquei que era uma norma do torneio, mais uma vez lembrei de 1984, do George Orwel, e da mentalidade totalitarista que o livro denuncia. A FIFA ou a UEFA, querendo participar, poderiam fazer tocar uma musiquinha que tivesse a ver com a seleção em questão, no mínimo!

Com uma igualdade imposta, o coletivismo do ato perde sentido a partir do momento em que se torna, mais e mais, artificial. Perde-se, nesse novo ritual, a possibilidade do torcedor se manifestar pela sua identidade e tradições nacionais. Perde-se a espontaneidade que o momento propicia, condensando-a num gesto premeditado e repetitivo. Mais uma vez, os donos do futebol tentam assemelhá-lo, tanto quanto possível for, a um jogo de vídeo game: é gol? Toca a musiquinha! Sintetize-se a alegria! Agora, vai perguntar a um torcedor do Boca Juniores ou do Corinthians (só para prestigiar os finalistas de amanhã) se eles topariam substituir seus cânticos históricos pelo último sucesso da Beyoncé ou do Teló; tenha dó!

São fatos assim que entristece o cidadão... E também ver um campo rodeado por seguranças robóticos que não se movem por nenhum motivo, que não o de reprimir possíveis invasões ou de informar supostas infrações cometidas pelo torcedor. São figuras estranhas que tiram do esporte a sua verve popular e democrática ao estabelecer uma cultura de vigilância e terror à beira dos gramados – sempre em nome da proteção máxima ao patrocinador e não ao torcedor, registre-se.

Algo que se contrapõe ao futebol de ontem, quando na Copa de 82, no fatídico Brasil 2x3 Itália, uma sorridente policial tomava conta, tranquilamente, de toda uma extensão da arquibancada do Sarriá, ao som do samba, do suor e da cerveja da torcida brasileira!

Ano que vem, o Brasil vai fazer seu papel de bom garoto, atendendo a toda e qualquer vontade da FIFA durante a Copa das Confederações – evento-teste para a Copa do Mundo. Resta saber se o novo jeito do Brasil jogar, fora de campo, irá respeitar a cultura nacional ou se se converterá em apenas mais uma demonstração do nosso colonialismo atávico. Com a palavra, o ufanista Ministro Rebelo.

foto de joão sassi
campão do varjão - df