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Alex de Souza; honrando em campo as ricas tradições bizantinas. |
A Turquia é um país que fica longe do Brasil. A maioria dos
brasileiros nem deve saber que sua capital é Ancara, muito menos conhecida que Istambul,
que por sua vez, um dia fora Bizâncio, noutro, Constantinopla que, de tão bem estrategicamente
localizada, serviu de capital a nada menos do que quatro impérios (Romano,
Bizantino, Latino e Otomano). É uma
espécie de corredor cultural da história da humanidade e uma das três capitais
culturais da Europa.
Mas o brasileiro só conhece a Turquia por causa do futebol.
Primeiro porque ganhamos deles duas vezes numa única Copa;
em 2002, quando levantamos o caneco do pentacampeonato. E segundo – e mais
importante -, por conta de Alex, vulgo “Dorminhoco, Sonolento etc.”, craque que
acaba de rescindir seu vínculo com o Fenerbahçe e que poderá, tal qual um Pet,
um Seedorf, um Zé Roberto ou um Deco, desfilar sua harmonia futebolística por estas
paragens em grande estilo, no ocaso da carreira.
Mais que apenas um mero sócio do “Injustiçados Futebol Clube”
(em cujas fileiras destacam-se craques do porte de Rivaldo, Ademir Menezes,
Adílio e outros), Alex talvez esteja se revelando um modelo de cidadão no qual os
demais jogadores brasileiros poderiam e deveriam se espelhar. Um cidadão
antenado no que se passa à sua volta, e que se mostra tão lúcido dentro de
campo quanto fora dele; em suma, um antípoda da contemporaneidade ludopédica
brasileira, ora ilustrada pela arrogância e pelo narcisismo.
Alex não é nada disso. Aliás, fora de campo, com seus óculos
de intelectual e sua cara de gente comum, nos passa a imagem de quem não está
nem um pouco preocupado em construir uma imagem, seja ela qual for. Alex é
ponderado sempre que entrevistado, revelando contumaz sensatez em suas falas. E
vai além, pois estuda e lê. De outro modo, não aprenderia a falar turco, como
aprendeu. Não precisaria tê-lo feito, posto que não se falasse tal idioma em
nenhum outro lugar do mundo... Mas ele fez. E durante oito anos, jogou bola pra
caralho pelo Fener. Virou ídolo. Estátua em plena capital cultural do mundo.
Coisa que só alguns imperadores e sultões de bizantinas eras conquistaram.
E mesmo eternizado, demonstrou humildade ao fazer reverência
a Zico, seu maior ídolo, por quem foi comandado numa das melhores fases do
time. É o tipo de declaração que revela como a fama ou o dinheiro falharam ao tentar
corromper seu caráter.
Na última semana, ao se reunir com seu ex-técnico, Aykut
Kocaman, o meia-atacante escutou que, por ser “grande e forte demais”, seria
afastado da equipe. Foi a forma que seu desafeto encontrou para impedi-lo de
suplantá-lo na condição de maior goleador de todos os tempos do Fenerbahçe. Mesquinharia da mais pura categoria. Pequenez
explícita.
Em resposta, a torcida fez do condomínio onde mora o craque, em Istambul, uma arquibancada flamejante cujo combustível foi uma bandeira com a estampa do presidente do clube. O povo turco deixava claro de que lado estava. Reconhecimento mais genuíno que o popular não há.
Porém, para azar deles e sorte nossa, em breve Alex deverá estar de volta ao Brasil, trazendo na bagagem mais cultura e sapiência que antes. Fará a alegria de palmeirenses
e cruzeirenses, e também a minha, a do Tostão* e de todo aquele que se
espelha no que há de bom na vida para seguir melhorando. Bem vindo de volta à casa, Alex.
* O genial cronista e ex-craque foi como uma alma penada, antes do Mundial da África, a clamar pela presença de Alex no Time da CBF